segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Fora Artuzi e TODAS as Máfias: a saga continua

  É incrível quando podemos notar o desenrolar de conjunturas em alguns momentos específicos, como no turbilhão de acontecimentos envolvendo o alto escalão da prefeitura de Dourados, a fina flor da burguesia local e a nobre vereância de nossa cidade. Em pouco mais de dois meses o barco já rumou pra várias direções, mas, infelizmente, ainda não saiu do lugar. Entre artimanhas obscuras e às claras, posses, afastamentos, decretos e promessas todos estão escapando com quase nenhum arranhão.

Do protagonismo das ruas ao dos gabinetes
(polícia prepara-se para atacar populares em Dourados)


  Quando lançamos a edição anterior de nosso jornal, primeira quinzena de setembro, com os escândalos e as prisões tendo recentemente acontecido, a cidade havia sido tomada pelo clima de indignação. Só se falava nisto. Mobilizações pipocavam quase que diariamente, sempre com maior número de participantes, enquanto as estruturas de estado batiam cabeça sobre o que fazer dado o ineditismo do caso. Esta ascensão popular manteve-se até a sessão na noite de segunda-feira, 13 de setembro. Nesta noite ocorreu o pico da movimentação, com uma mobilização gigantesca de populares de todos os cantos da cidade. Sendo proibida de adentrar no recinto a multidão aglomerou-se, com carros de som, do lado da Câmara Municipal, enquanto a maioria das falas repudiava tal proibição. De repente a polícia agride e prende um trabalhador, o que revoltou os manifestantes que foram em direção à porta do prédio, onde ocorria o fato. Foi então que a polícia começou sua demonstração de brutalidade e selvageria. Tiros de bala de borracha disparados a esmo, bombas de gás e de efeito moral, gás pimenta no rosto, inclusive, de idosos e o pau cantando no lombo da população. Como meio de defender a integridade física de pessoas já feridas, os manifestantes revidaram com pedras e pedaços de madeira, sem arredar o pé, fazendo com que a batalha campal durasse cerca de 40 minutos. Com isto a sessão já tinha ido para os ares, e os vereadores presentes sumido sabe-se lá pra onde.
  No dia seguinte nova manifestação, agora à tarde e de fronte ao Fórum, cobrando a deposição e exigindo explicações para as agressões sofridas na noite anterior. Porém foi justo neste dia que começou o desmantelamento da mobilização popular e a passagem do protagonismo para os gabinetes de políticos. O juiz-prefeito chama pra uma reunião a portas fechadas pelegos dirigentes de alguns sindicatos, de onde saem com um discurso de colaboração com o juiz e sua prefeitura interina. Estes mesmos setores pelegos partem, então, pra uma tática que consistia em: controlar os comitês Fora Artuzi ou destruí-los, sendo que a segunda opção é a que foi utilizada.
  Com as eleições se aproximando, e os riscos de envolvimento em mobilizações como às que vinham ocorrendo, os pelegos empenham-se por fazer passar em seus sindicatos a tese do “vamos confiar na justiça e nas estruturas democráticas”, causando um revés no ímpeto popular inimaginável há apenas alguns dias antes. E como se não bastasse, o governo do estado desloca para Dourados um contingente policial de cerca de 500 homens para garantir a segurança dos vereadores para a retomada dos trabalhos da Câmara, assustando e afugentando a população, garantindo assim que fosse realizada uma sessão, ainda que para isso tivessem que isolar quarteirões em todas as direções das proximidades, o que realmente fizeram.

As manobras das classes dominantes
(Artuzi contando e guardando maços de dinheiro)


  Na edição anterior de nosso jornal apontamos cinco teses, que vinham sendo defendidas por diferentes setores políticos, e que disputavam a hegemonia nas discussões e encaminhamentos: 1) Restauração da administração Artuzi; 2) Manutenção da administração interina; 3) Posse das suplências; 4) Intervenção do governo do estado e 5) Novas eleições. Vejamos o suceder dos fatos e as intervenções destas posições.
  Quebrado o ímpeto dos protestos as forças proponentes de tais teses passaram à tática, mais conforme a seus gostos, dos acordões de gabinete. Com o surgimento de novas filmagens de políticos denunciando esquemas de corrupção, agora envolvendo também o governador, André “Führer” Puccinelli, deputados estaduais e o Ministério Público os defensores da intervenção do governo do estado e da manutenção da administração interina manobram, publicamente, uma última vez. O governo intervém através do aparato policial pra impedir a retomada de manifestações, enquanto o juiz, prefeito interino, é exonerado, mas mantém-se o quadro de secretariados formado por ele.
  Os suplentes assumem as vagas dos vereadores que foram afastados, mas que mantém seus cargos e salários, fazendo dobrar o orçamento gasto com a “respeitável casa de leis”, enquanto “Dona Délia”/PMDB, esposa do “iluminatti” Roberto Razuk, tida agora como o maior pilar da moralidade em Dourados, é empossada como prefeita. Este cenário saiu melhor que a encomenda para a extrema-direita da região (sindicato rural/DEM/PMDB/PSDB). Com a subida de Délia ao palacete municipal, a certeza da impunidade e da continuidade dos “contratos” está, assim, ao alcance de suas mãos, direitas é claro.
  Já o PT, que vinha se auto-proclamando como o campeão na defesa de novas eleições e da deposição de todos os envolvidos, viu o seu número de vereadores dobrar, de um pra dois, enquanto seu líder Dirceu Longhi, agora também indiciado nos esquemas, sobe à presidência da Câmara, fazendo com que seus pelegos sindicais lancem uma carta aberta à população onde conclamam o povo “a dar um voto de confiança à prefeita Délia Razuk e aos vereadores”, e a “esperar de forma ordeira o desenrolar dos fatos”. Pra completar o pacotão a ex-vereadora petista Margarida Gaigher assume a secretaria de educação, para o delírio de seus correligionários. Ou seja, configurou-se, de forma incrível, o primeiro governo municipal composto por membros de tudo quanto é partido eleitoral.
  Enquanto isso, da cadeia, Artuzi, através dos infinitos recursos e hábeas corpus, vêm ganhando tempo e retomando força política através das CPIs, compostas por, acreditem, envolvidos nos escândalos e seus partidários, podendo, inclusive, não apenas ser solto à qualquer momento, como também retornar ao trono.
  A tese da posse das suplências conseguiu, portanto, momentaneamente, fazer uma síntese dos interesses das diferentes frações e facções das classes dominantes, garantindo para todos os seus partidos fatias neste bolo, nossa cidade, que estão ávidos por devorar. Ora, com os suplentes assumindo, os partidos dos nomes envolvidos mantiveram seus gabinetes, possibilitando a Artuzi e seus sócios maiores alternativas de defesa. Apesar da exoneração do juiz, seus secretários foram mantidos, com exceção da pasta da educação cedida ao PT, fazendo com que mesmo a bandeira de novas eleições seja abandonada pelo partido que, aliás, teve o deputado estadual eleito Laerte Tetila condenado, há poucos dias, por improbidade administrativa quando de seu mandato como prefeito da cidade, num caso, inclusive, que é do mesmo esquema, com as mesmas máfias empresariais, de Artuzi. Com os novos vereadores a escolha de Délia Razuk como presidente da Câmara era óbvia, já que sabe-se lá por intermédio de que força, não teve, ainda, seu nome citado nestas investigações e, sua conseqüente subida ao posto de prefeita era a garantia que os grandes fazendeiros e as velhas máfias empresariais locais precisavam, de que a prefeitura rezaria no be-a-bá do governo do estado/sindicato rural.

Deposição dos corruptos e conquistas populares só na luta

  Com todo este enredo, no nosso entendimento, só resta à população douradense voltar a ocupar as ruas e as sessões da câmara municipal, para pressionar pelo impeachment de todos os envolvidos e por, no mínimo, que se realizem novas eleições, não permitindo a subida indireta da família Razuk à chefia da prefeitura. Mesmo sabendo que independente de qual quadrilha vier a ocupar o cargo de prefeito, é só com muita organização e luta que nosso povo conseguirá avançar no cumprimento de nossas exigências perante as classes dominantes, está claro que um novo processo eleitoral estenderá a instabilidade política, dando maior tempo de mobilização, debate e disputa para as demandas dos movimentos sociais. É imprescindível a retomada dos comitês Fora Artuzi, a partir dos que não foram cooptados/desintegrados pela camarilha pelega do comitê de “defesa popular”, e que sejam colocadas publicamente as propostas e pautas de mais além que as eleições, efetuando a denúncia das máfias empresariais e apresentando as exigências populares para as áreas afetadas pelos esquemas, que no caso são todos os serviços essenciais da cidade.
  Depois desta dolorosa experiência adquirida na luta, sobre o papel nefasto e traiçoeiro que esta pequena seita chamada comitê de “defesa popular” – que ao contrário do que alguns dizem não é formado apenas pelo PT, mas também por, palavras deles, “setores de esquerda(sic) do DEM, PMDB e PSDB” – vem  efetuando dentro e contra a vontade dos movimentos e organizações populares que dizem congregar. Convocamos nossa militância e amig@s a intervirem decididamente em seus espaços de atuação, propondo a imediata ruptura das organizações que ainda são ligadas a esta sigla que, se realmente deseja prestar algum serviço ao povo de nossa cidade, deve deixar de existir. Desafiamos, ainda, publicamente, que estes chefetes venham pra discussão nas assembléias sindicais sobre se a base respalda a utilização dos nomes dos sindicatos nas jogatinas de gabinete do comitê de “defesa popular”.
  Continuamos firmes em nossas barricadas, deixando bem claro que novos capítulos estão pra ser escritos nesta história. Nenhum passo atrás!
Fora Artuzi e TODAS as máfias!
 

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

O Libertário Novembro/Dezembro 2010

Companheir@s
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quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Eleições 2010: neoliberalismo e agronegócio continuam em alta

  Passado o circo da sangria popular chamada de eleições burguesas o resultado é o previsto: continuam no poder André Puccinelli/PMDB e seu sindicato rural no MS e o neo-varguista PT de Dilma na presidência da República. Ancoradas, sobretudo, na utilização da máquina estatal como propaganda, prática obrigatória de todos os partidos eleitorais, as candidaturas vencedoras já se dedicam à formação de seus gabinetes.

Latifúndio, cana e repressão: A receita de Puccinelli

  A reeleição de Puccinelli no primeiro turno representa o domínio pleno do modelo latifundiário de desenvolvimento. É lógico que o “contraponto” personificado por Zeca do PT nestas eleições não passava de ficção, afinal PT e PMDB são parceiros íntimos nacionalmente, Temer, o vice de Dilma, é do PMDB, além de Zeca ser um latifundiário também ligado ao sindicato rural, ou seja, tratou-se de uma disputa em torno do nome que melhor pudesse gerenciar o mesmo projeto.  Ganhou Puccinelli. Nem mesmo os sucessivos escândalos de vésperas de eleição, como o esquema dos “cupinchas” nas moradias populares e a alcagüetagem de seu sócio em maracutaias, Ary Rigo, conseguiram arranhar a “boa-fama” do “Führer” sulmatogrossense, célebre nas crônicas políticas por defender estupros, espancamentos e assassinatos contra “maconheiros” e homossexuais e por considerar povos indígenas “vagabundos”.
  Agora o sindicato rural recebeu mais quatro anos de carta branca para aprofundar o processo sucro-alcooleiro, dando continuidade à conversão do pólo econômico do estado para a cana-de-açucar, cujos principais eixos pros próximos anos são:
  • Industrialização, com matriz sucro-alcooleiro, de regiões do interior: este fenômeno pode ser notado por todo o sul, incluindo Dourados, do estado e já se estende por todas as outras regiões;
  • Monocultura extensiva: com a cana de açúcar ganhando hegemonia a monocultura está sendo alçada a um novo patamar, cujo resultado final não é mais o escoamento do produto bruto, como quando da soja e trigo, mas sim o abastecimento das próprias usinas locais, gerando um cenário de ciclos de plantio muito mais rápidos e um desgaste do solo inimaginável, cenário que se agrava pelo uso constante de fertilizantes químicos e venenos e pela prática das queimadas, que apesar de toda a conversa apregoada por parlamentares continua sendo permitida;
  • Concentração de terras cada vez em maior escala: esta praga da concentração fundiária, doença antiga do capitalismo de grandes fazendeiros que reina no MS, vem sendo agravada desde o advento das usinas. Tornou-se prática comum a criação de “trustes rurais” que visam tragar pequenas propriedades e mesmo comunidades inteiras para dentro de seus infindáveis canaviais. Através da pressão econômica, do arrendamento e outras políticas, assistimos vastos territórios transformaram-se, na prática, em propriedade de uso de um único grupo, para uma única finalidade, cujo exemplo mais marcante é a área rural do município de Laguna Caarapã que, quase que totalmente, é sugada pelo grupo São Fernando;
  • Transformação de cidades e estradas: todo investimento pesado em infra-estrutura, levado à frente pelo governo do estado nos últimos anos, têm um único objetivo: possibilitar maior dinâmica logística para o deslocamento da cana e derivados, daí as duplicações de rodovias para abrigar o trânsito de caminhões e implementos agrícolas, e o adequamento das chamadas “cidades pólo” para o melhor fluxo financeiro do agronegócio através das construções de parques de exposições, anéis rodoviários, espaços de convenções e outras obras de interesse das classes privilegiadas;
  • Precarização contínua das condições de trabalho: com a industrialização repentina de áreas do interior, tradicional celeiro do desemprego, as vagas oferecidas estão sendo recebidas como bênçãos dos céus, o que vêm possibilitando aos usineiros a consolidação da precariedade estrutural e, através da fomentação de sindicatos pelegos, manter o operariado agrícola, especialmente, desorganizado e sem capacidade de reação. O fato da tomada territorial do estado pelas usinas possibilita com que em regiões onde a organização sindical avançar, os patrões podem rapidamente fechar as portas e mudar-se para outra região (veja o exemplo dos frigoríficos), cuja área rural já estará preparada para acolher a usina. Conflitos trabalhistas relacionados à precariedade serão a próxima novidade política no MS, estado sem tradição de lidar com uma grande classe operária;
  • Repressão violenta aos movimentos sociais: para garantir a efetivação de seu projeto o governo/sindicato rural utilizará de seu meio favorito: repressão e violência contra o povo pobre. A escalada de violência no campo, contra os povos originais (indígenas), remanescentes de quilombos e camponeses sem-terra só tende a crescer, visto que a reeleição foi o parecer necessário que o agronegócio esperava para avançar no seu projeto e a criminalização das lutas sociais será pedra de toque em sua nova gestão. Mesmo tendo abafado o caso na imprensa nas vésperas de eleições, o sindicato rural vinha tentando imputar ao MST e às comunidades Guarani um envolvimento com as guerrilhas no Paraguai, o que provavelmente voltará, em breve, aos holofotes da mídia.
Dilma e o neo-varguismo lulista

  A eleição de Dilma Russef como presidente do Brasil vem para consolidar o PT como gerente preferido dos interesses neoliberais no país, tendo mais quatro anos para aprofundar as reformas de interesse do sistema financeiro internacional, iniciadas já há 16 anos quando da subida do PSDB ao poder. Com um leque de alianças e apoios tão amplo que seria inimaginável a alguns anos, a coligação Dilma veio ancorada na capacidade de administração dos negócios da burguesia por seu partido, no uso descarado e banditista dos “programas sociais”, as famosas bolsas e projetos neoliberais herdados do governo FHC, como moeda de troca na jogatina eleitoral, nos investimentos maciços em infra-estrutura para atender às demandas dos setores ricos através do PAC, gerando o mito do melhorismo, e, claro, no controle ferrenho das principais organizações da classe trabalhadora, fazendo-as recuar em todos os pontos, que há algum tempo, eram tidas como posições conquistadas.
  A popularidade de Lula, fenômeno que teve enorme peso na vitória de Dilma é algo bem mais complexo do que simples carisma. Remonta a todo um compêndio de aparelhamento dos movimentos sociais, que vem sendo montado desde meados dos anos 80, para o desvirtuamento das bandeiras de luta historicamente disputadas pelo povo e sua utilização como espaço de adesão cega às políticas governamentais, num cenário de institucionalização das organizações populares, e legitimação do processo pelas mesmas, que desde a era Vargas não era visto por aqui. Isto tem permitido com que o PT apresente-se como uma face “humana” do neoliberalismo, enquanto seu irmão-siamês, o PSDB, mostra a verdadeira carranca.
  Pelos setores sociais que pesaram economicamente na campanha, e pela própria plataforma da candidatura Dilma, podemos esperar a continuidade da conversão econômica dos estados da região Norte e Centro-Oeste para o modelo de feudos industriais-agrícolas, o aprofundamento da terceirização de serviços públicos e das Parcerias Público Privadas/PPP e a sangria autorizada da população trabalhadora pelo sistema financeiro e pelo mercado internacional.

Só a luta popular constrói e transforma

  No nosso entendimento a principal tarefa que cabe ao nosso povo, neste próximo período, é a retomada de suas bandeiras e organizações. É preciso a articulação de um pólo anti-capitalista e anti-governista, que se contraponha à política de capitulação do colaboracionismo agora vigente, e que venha dar maior fôlego e estrutura de atuação aos setores combativos, agora dispersos, dos movimentos populares no MS e em todo o Brasil. Com todo o cenário de engajamento, direto ou dissimulado, das centrais sindicais e espaços de entendimento popular para com o governo, abre-se, sob nossa opinião, a necessidade do início imediato de construção de uma alternativa ao governismo e para-governismo, que possa disputar um outro viés para a militância e novos rumos para as organizações de base de nossa gente. Atualmente todo partido eleitoral conta com sua central sindical/popular, deixando aos/as trabalhadores/as poucas opções concretas de projetos, apesar das diversas siglas, o que faz-nos acreditar na necessidade da construção de uma ferramenta que se paute na combatividade e na independência de classe, e que possa levantar um projeto de protagonismo e Poder Popular.
  Estaremos juntos de nosso povo, ombro a ombro, por que para nós, Anarquistas, só a luta popular constrói e transforma!

sábado, 13 de novembro de 2010

Mais um ano sem Marçal Tupã-í de Souza, guerreiro Guarani!!

 No próximo dia 25 de novembro fará 27 anos que Marçal de Souza, conhecido também como Marçal Guarani, ou como Tupã’í (pequeno Deus) foi assassinado, sendo que até hoje não houve nenhum preso por este trágico momento para o povo Guarani
  Tupã’í foi uma das maiores lideranças na luta pela retomada das terras roubadas pelo estado e passadas às mãos de grandes fazendeiros, que hoje plantam cana-de-açúcar ou criam bois para abastecer o mercado de consumo e lucro desenfreado que "nossa" sociedade vêm propondo e impondo como modelo a ser perpetuado, em detrimento dos direitos e das vidas de comunidades inteiras.
  Este guerreiro ficou conhecido pela sua capacidade fascinante de analisar e de falar em oportunidades públicas sobre a opressão e a violência que seu povo sofria. 
  Aos 63 anos de idade, Marçal foi assassinado devido um conflito de terra no município de Bela Vista/MS, onde se colocou ao lado de aproximadamente 30 famílias que lutavam pelo direito de permanecer em suas terras. O caso é emblemático para a história do Mato Grosso do Sul, pois mesmo sendo comprovado que um dos 5 tiros que foram disparados contra Marçal de Souza, inclusive um que atingiu diretamente a boca, saiu da arma de um dos capangas da fazenda Serra Brava ninguém foi preso, sendo seu julgamento adiado por várias vezes até que, após 25 anos, o crime não mais tivesse validade para os tribunais do estado burguês.
  O caso é que Tupã’í foi assassinado, porém a proposta aqui não é chorar pela sua morte, mas sim divulgar suas lúcidas idéias e seu belo exemplo que sempre permanecerão na luta indígena pela retomada de seus territórios. 
  Para refletir aqui seguem algumas de suas palavras: 

  “O verde de nossa bandeira que os brasileiros carregavam representava a mata que a civilização nos tirou; vivemos nas terras do governo como párias, esmagados sempre. O amarelo que representa a riqueza do Brasil, a pesca a caça, hoje estão ausentes de nossas terras; tiraram-nos tudo em nome da civilização. O branco, que simbolizava a paz tão desejada, hoje está ausente do homem. E finalmente, o azul, que representava o céu, na sua beleza florida – estrelas e astros a brilhar –, foi a única coisa que a civilização deixou ao índio, e isso porque ela não pôde conquistar ainda.” (Marçal de Souza) 


“Vivemos em terras invadidas, intrusadas. Nossas leis são feitas por pessoal lá de cima, que dizem que nós temos direitos. Nós temos direito no papel, mas onde está na realidade?”(Marçal de Souza) 



“Somos uma nação subjugada pelos potentes, uma nação espoliada, uma nação que está morrendo aos poucos sem encontrar o caminho, porque aqueles que nos tomaram este chão não têm dado condições para a nossa sobrevivência” (Marçal de Souza) 

“Além de sermos os donos primitivos e legítimos dessa terra, temos a lei feita pelos brancos para nos proteger. Mas essa lei não está funcionando. É isso que temos que cobrar do governo que nos deixou no abandono. A lei maior é a natureza... Infelizmente, a lei da natureza é desrespeitada pela lei dos homens.” (Marçal de Souza) 

  Alarmante é o fato de que hoje os Guarani e Kaiowá de Mato Grosso do Sul ainda permanecem em constantes conflitos pela retomada de suas terras e pela reorganização de seus tekoha. Ou seja, o motivo da morte de Marçal de Souza continua sendo uma questão em aberto em nossa região, sem perspectivas de solução até o momento. 


Não queremos emancipação, nem integração. Queremos o nosso direito de viver, Jamais o branco compreenderá o Índio. Queremos ser um povo livre como antigamente. O índio está cercado, amordaçado por uma democracia que não funciona. Por isso nós vamos a campo. (Marçal de Souza Tupã’I – assassinado por uma disputa de terra em 1983) 



domingo, 7 de novembro de 2010

Fóruns conciliadores e institucionalização dos Movimentos Sociais

  Historicamente as classes dominantes sempre utilizaram de diversas formas, e não apenas da violência, para desarticular e pôr fim às movimentações populares que surjam de forma autônoma e autêntica no seio das classes oprimidas. Uma das formas que tem se mostrado mais eficazes é a institucionalização dos movimentos sociais, prática que vêm sendo agravada nos últimos anos, mas, contudo, já é um fenômeno bem mais antigo.
  Esta institucionalização é levada a cabo quando um movimento, formado por determinado setor social que disputa a satisfação de uma demanda específica, porém abrangente, é arrastado à participação dentro de algum fórum conciliador estatal, onde, teoricamente, o movimento teria condições de debater com governantes e ricos como e onde seriam investidos recursos e aplicadas as políticas públicas que são de seu interesse. Porém, na prática, o que acontece é o enquadramento do setor popular na agenda política burguesa, prendendo-o nas entrelinhas da legalidade estatal e, a partir daí, impedindo e criminalizando toda e qualquer luta autônoma das classes oprimidas, cujos métodos e anseios não estejam previstos no âmbito destes fóruns conciliadores.
  No início do século XX, quando da ascensão dos primeiros movimentos de trabalhadores no Brasil, impulsionados, sobretudo pelo Sindicalismo Revolucionário e por grupos Anarquistas, o Estado e as classes dominantes levaram ao termo a matança dos militantes operários mais influentes e combativos ao mesmo tempo em que preparava o terreno da institucionalização do movimento sindical, que tomou corpo, durante o Estado Novo, nas leis trabalhistas e na criação do Ministério do Trabalho. Ainda que as ditas leis trabalhistas reconhecessem a vitória da luta dos trabalhadores quanto à jornada máxima de 8 horas diárias, do estabelecimento do salário mínimo, de férias remuneradas, etc., as classes dominantes estabeleceram, através do Ministério do Trabalho, as regras que queriam para a forma com que os trabalhadores poderiam organizar seus sindicatos o que, obviamente, era na verdade a total criminalização dos métodos de ação direta e autonomia do Sindicalismo Revolucionário e a aclamação do sindicalismo atrelado ao Estado e com o rabo preso com a patronal, o que ficou historicamente conhecido como “sindicalismo pelego”. Na época as classes dominantes acabaram contando com a ajuda do PCB, o “partidão”, que vinha ganhando influência com o extermínio de anarquistas efetuado pelo governo, e sonhava com a direção da máquina estatal apoiando, portanto, coerentemente com seu projeto, a institucionalização do movimento sindical. Esta conjuntura perdurou por décadas, agravada durante a Ditadura Militar, e vendo-se desnudada e, momentaneamente, rompida pelo “novo sindicalismo” em fins da década de 1970.
  O chamado “novo sindicalismo” representou num primeiro período o resgate da autonomia popular e de seus movimentos perante as classes dominantes, surgindo na época a Central Única dos Trabalhadores/CUT que se propunha a romper com o peleguismo e se pautar na luta direta dos trabalhadores para alcançar seus anseios. Só que ao mesmo tempo as principais lideranças cutistas fundavam o PT e, quanto mais o partido crescia, abocanhando cargos no Estado e fazendo, necessariamente, alianças e coligações com setores patronais, mais o “novo sindicalismo” definhava, transformando-se, atualmente, em uma potente correia de transmissão das políticas governamentais. Através da Reforma Trabalhista e da conseqüente Reforma Sindical, concretizada de forma eficaz em etapas, volta a emergir a institucionalização do movimento sindical, agora do chamado “novo sindicalismo” em estruturas não muito diferentes das criadas na Era Vargas, contudo com nuances de participatividade.
  Outro forte meio de institucionalização dos movimentos sociais é o chamado “orçamento participativo” e seus “conselhos municipais”. O orçamento participativo tomou corpo em Porto Alegre, quando da chegada do PT à administração da cidade, apontado inicialmente como um grande exemplo de política pública de esquerda, vindo a chamar a atenção de diversos setores no mundo todo e a ser implantado em diversas cidades do Brasil onde o partido chegava ao poder, o orçamento participativo logo demonstrou sua dubiedade. Ao mesmo tempo em que atendia parcialmente a reivindicação popular de opinar em como deveria ser gastos os recursos públicos, também criava uma série de parâmetros reguladores para como poderia ser realizada a organização e a movimentação popular de quem quisesse ter representatividade nos conselhos de decisão do orçamento participativo. E estes parâmetros reguladores eram, logicamente, a legalidade burguesa e a participação indireta, através de representantes ou conselheiros, da comunidade.
  Ora, sendo assim, em um curtíssimo período de tempo, este modelo descambou a ser uma “pré-escola” para políticos, criando uma gama de especialistas na “arte de ser representantes”, e espezinhando qualquer iniciativa de protagonismo da comunidade que pudessem vir a prescindir da autoridade dos conselheiros, além de não atender a nenhuma reivindicação popular concretamente, vindo sim a impor aos participantes a adesão cega às políticas governamentais, já que aparentemente teriam participado da elaboração das mesmas. E, como não poderia deixar de ser, rapidamente as administrações de todas as colorações partidárias perceberam as beneficies que o orçamento participativo poderia proporcionar-lhes, sendo que hoje todas seguem adotando-o, vide o caso aqui em Dourados.
  Para nós é um crime contra nosso povo silenciar sobre o perigo que espreita por trás dos belos discursos de democracia e tolerância presentes nas políticas de institucionalização dos movimentos populares. É corrente vermos um grande número de pessoas sinceras, que querem fazer algo por e junto com suas comunidades, serem arrastadas e tragadas pela participação em tais fóruns. Sendo apresentado, tanto pelas classes dominantes quanto por pelegos que se dizem militantes sociais, como a mais justa, ou ainda como a única via para a luta popular, estes modelos de enquadramento vêm minando a organização e a resistência popular. Afinal, se a participação através de representantes, nos fóruns de conciliação com a burguesia/governo é a única forma de participação política popular vislumbrada, o trabalho de base, a militância e a luta direta protagonizada pelo povo é totalmente abandonada e, mais que isso, criminalizada como provocação, irresponsabilidade e como prejuízo à própria comunidade.
  No nosso entendimento é urgente rompermos esta situação. É preciso que todos os militantes e pessoas que realmente querem trabalhar por mudanças sociais profundas intervenham energicamente em todos os espaços de organização de sua comunidade. Seja nos sindicatos, grêmios escolares ou associações de moradores é preciso contrapor, com organização, resistência e luta, a institucionalização dos movimentos sociais e a conseqüente criminalização das lutas diretas, protagonizadas pelas classes oprimidas. Defendemos, ainda a construção de um fórum destinado a consolidar-se como um contraponto ou contra-poder perante as instâncias conciliadoras, apoiado em um profundo trabalho de formação de base e protagonismo comunitário, onde a mobilização e a combatividade sejam apontadas como as principais características a serem buscadas, já que assim, mesmo que um movimento ou organização defina taticamente a participação momentânea em alguns destes fóruns conciliadores, a mobilização nas ruas possa garantir um efetivo poderio de barganha para as disputas das demandas que realmente nosso povo trabalhador urge em satisfazer.