quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Eleições 2010: neoliberalismo e agronegócio continuam em alta

  Passado o circo da sangria popular chamada de eleições burguesas o resultado é o previsto: continuam no poder André Puccinelli/PMDB e seu sindicato rural no MS e o neo-varguista PT de Dilma na presidência da República. Ancoradas, sobretudo, na utilização da máquina estatal como propaganda, prática obrigatória de todos os partidos eleitorais, as candidaturas vencedoras já se dedicam à formação de seus gabinetes.

Latifúndio, cana e repressão: A receita de Puccinelli

  A reeleição de Puccinelli no primeiro turno representa o domínio pleno do modelo latifundiário de desenvolvimento. É lógico que o “contraponto” personificado por Zeca do PT nestas eleições não passava de ficção, afinal PT e PMDB são parceiros íntimos nacionalmente, Temer, o vice de Dilma, é do PMDB, além de Zeca ser um latifundiário também ligado ao sindicato rural, ou seja, tratou-se de uma disputa em torno do nome que melhor pudesse gerenciar o mesmo projeto.  Ganhou Puccinelli. Nem mesmo os sucessivos escândalos de vésperas de eleição, como o esquema dos “cupinchas” nas moradias populares e a alcagüetagem de seu sócio em maracutaias, Ary Rigo, conseguiram arranhar a “boa-fama” do “Führer” sulmatogrossense, célebre nas crônicas políticas por defender estupros, espancamentos e assassinatos contra “maconheiros” e homossexuais e por considerar povos indígenas “vagabundos”.
  Agora o sindicato rural recebeu mais quatro anos de carta branca para aprofundar o processo sucro-alcooleiro, dando continuidade à conversão do pólo econômico do estado para a cana-de-açucar, cujos principais eixos pros próximos anos são:
  • Industrialização, com matriz sucro-alcooleiro, de regiões do interior: este fenômeno pode ser notado por todo o sul, incluindo Dourados, do estado e já se estende por todas as outras regiões;
  • Monocultura extensiva: com a cana de açúcar ganhando hegemonia a monocultura está sendo alçada a um novo patamar, cujo resultado final não é mais o escoamento do produto bruto, como quando da soja e trigo, mas sim o abastecimento das próprias usinas locais, gerando um cenário de ciclos de plantio muito mais rápidos e um desgaste do solo inimaginável, cenário que se agrava pelo uso constante de fertilizantes químicos e venenos e pela prática das queimadas, que apesar de toda a conversa apregoada por parlamentares continua sendo permitida;
  • Concentração de terras cada vez em maior escala: esta praga da concentração fundiária, doença antiga do capitalismo de grandes fazendeiros que reina no MS, vem sendo agravada desde o advento das usinas. Tornou-se prática comum a criação de “trustes rurais” que visam tragar pequenas propriedades e mesmo comunidades inteiras para dentro de seus infindáveis canaviais. Através da pressão econômica, do arrendamento e outras políticas, assistimos vastos territórios transformaram-se, na prática, em propriedade de uso de um único grupo, para uma única finalidade, cujo exemplo mais marcante é a área rural do município de Laguna Caarapã que, quase que totalmente, é sugada pelo grupo São Fernando;
  • Transformação de cidades e estradas: todo investimento pesado em infra-estrutura, levado à frente pelo governo do estado nos últimos anos, têm um único objetivo: possibilitar maior dinâmica logística para o deslocamento da cana e derivados, daí as duplicações de rodovias para abrigar o trânsito de caminhões e implementos agrícolas, e o adequamento das chamadas “cidades pólo” para o melhor fluxo financeiro do agronegócio através das construções de parques de exposições, anéis rodoviários, espaços de convenções e outras obras de interesse das classes privilegiadas;
  • Precarização contínua das condições de trabalho: com a industrialização repentina de áreas do interior, tradicional celeiro do desemprego, as vagas oferecidas estão sendo recebidas como bênçãos dos céus, o que vêm possibilitando aos usineiros a consolidação da precariedade estrutural e, através da fomentação de sindicatos pelegos, manter o operariado agrícola, especialmente, desorganizado e sem capacidade de reação. O fato da tomada territorial do estado pelas usinas possibilita com que em regiões onde a organização sindical avançar, os patrões podem rapidamente fechar as portas e mudar-se para outra região (veja o exemplo dos frigoríficos), cuja área rural já estará preparada para acolher a usina. Conflitos trabalhistas relacionados à precariedade serão a próxima novidade política no MS, estado sem tradição de lidar com uma grande classe operária;
  • Repressão violenta aos movimentos sociais: para garantir a efetivação de seu projeto o governo/sindicato rural utilizará de seu meio favorito: repressão e violência contra o povo pobre. A escalada de violência no campo, contra os povos originais (indígenas), remanescentes de quilombos e camponeses sem-terra só tende a crescer, visto que a reeleição foi o parecer necessário que o agronegócio esperava para avançar no seu projeto e a criminalização das lutas sociais será pedra de toque em sua nova gestão. Mesmo tendo abafado o caso na imprensa nas vésperas de eleições, o sindicato rural vinha tentando imputar ao MST e às comunidades Guarani um envolvimento com as guerrilhas no Paraguai, o que provavelmente voltará, em breve, aos holofotes da mídia.
Dilma e o neo-varguismo lulista

  A eleição de Dilma Russef como presidente do Brasil vem para consolidar o PT como gerente preferido dos interesses neoliberais no país, tendo mais quatro anos para aprofundar as reformas de interesse do sistema financeiro internacional, iniciadas já há 16 anos quando da subida do PSDB ao poder. Com um leque de alianças e apoios tão amplo que seria inimaginável a alguns anos, a coligação Dilma veio ancorada na capacidade de administração dos negócios da burguesia por seu partido, no uso descarado e banditista dos “programas sociais”, as famosas bolsas e projetos neoliberais herdados do governo FHC, como moeda de troca na jogatina eleitoral, nos investimentos maciços em infra-estrutura para atender às demandas dos setores ricos através do PAC, gerando o mito do melhorismo, e, claro, no controle ferrenho das principais organizações da classe trabalhadora, fazendo-as recuar em todos os pontos, que há algum tempo, eram tidas como posições conquistadas.
  A popularidade de Lula, fenômeno que teve enorme peso na vitória de Dilma é algo bem mais complexo do que simples carisma. Remonta a todo um compêndio de aparelhamento dos movimentos sociais, que vem sendo montado desde meados dos anos 80, para o desvirtuamento das bandeiras de luta historicamente disputadas pelo povo e sua utilização como espaço de adesão cega às políticas governamentais, num cenário de institucionalização das organizações populares, e legitimação do processo pelas mesmas, que desde a era Vargas não era visto por aqui. Isto tem permitido com que o PT apresente-se como uma face “humana” do neoliberalismo, enquanto seu irmão-siamês, o PSDB, mostra a verdadeira carranca.
  Pelos setores sociais que pesaram economicamente na campanha, e pela própria plataforma da candidatura Dilma, podemos esperar a continuidade da conversão econômica dos estados da região Norte e Centro-Oeste para o modelo de feudos industriais-agrícolas, o aprofundamento da terceirização de serviços públicos e das Parcerias Público Privadas/PPP e a sangria autorizada da população trabalhadora pelo sistema financeiro e pelo mercado internacional.

Só a luta popular constrói e transforma

  No nosso entendimento a principal tarefa que cabe ao nosso povo, neste próximo período, é a retomada de suas bandeiras e organizações. É preciso a articulação de um pólo anti-capitalista e anti-governista, que se contraponha à política de capitulação do colaboracionismo agora vigente, e que venha dar maior fôlego e estrutura de atuação aos setores combativos, agora dispersos, dos movimentos populares no MS e em todo o Brasil. Com todo o cenário de engajamento, direto ou dissimulado, das centrais sindicais e espaços de entendimento popular para com o governo, abre-se, sob nossa opinião, a necessidade do início imediato de construção de uma alternativa ao governismo e para-governismo, que possa disputar um outro viés para a militância e novos rumos para as organizações de base de nossa gente. Atualmente todo partido eleitoral conta com sua central sindical/popular, deixando aos/as trabalhadores/as poucas opções concretas de projetos, apesar das diversas siglas, o que faz-nos acreditar na necessidade da construção de uma ferramenta que se paute na combatividade e na independência de classe, e que possa levantar um projeto de protagonismo e Poder Popular.
  Estaremos juntos de nosso povo, ombro a ombro, por que para nós, Anarquistas, só a luta popular constrói e transforma!